sexta-feira, 4 de agosto de 2023

EDUCAÇÃO PATRIÓTICA E ÉTICA DO CIDADÃO ANGOLANO

 

[I]

PÁTRIA, NAÇÃO E CIDADANIA.

 

Angola, hoje, enfrenta um perigosíssimo processo de extinção do sentimento patriótico. Estamos nos tornando um país desprovido de sentimentos nobres. Nossa nobreza de sentidos está sucumbindo pela deformidade cognitiva do que seja patriotismo, moral e civismo. Essa ausência de valores é observada na acção iconoclasta de instituições públicas, na corrupção gerada pela política, na ausência de uma educação moralmente identificada, na falta de méritos na actividade privada e na falência cultural da sociedade.

Desse modo, é imperioso restabelecer os conceitos mais básicos sobre os valores que identificam a nação, a pátria, a soberania e a cidadania, para, então, identificar o que há de errado na nossa Angola. Esse é o sentido da nossa abordagem.

Identificação com a Pátria

O patriota é aquele que ama seu país e procura servi-lo da melhor forma possível. Patriotismo é um sentimento voluntário, unilateral, de amor e pertencimento. Revela a disposição de entrega à causa da pátria. O patriota (do grego patriotes – patrício), não apenas respeita; ele ama os símbolos da pátria, a bandeira, o hino, o brasão. Nutre identidade com os vultos históricos e as riquezas naturais. Ele serve ao seu país e é solidário aos que devotam o mesmo sentimento de patriotismo.

O Professor Paulo Nogueira Neto[II] lecionava que “homem é território”. Ele queria com isso dizer que toda actividade antrópica se refletia territorialmente. Trazendo esse pressuposto, a pátria é o território e o reflexo do homem – o conjunto de elementos que identificam o ser humano com sua terra natal, seus costumes, seus símbolos e seus ancestrais. A pátria soma elementos tangíveis (terra, água, ar, clima, paisagem, fauna, flora e símbolos nacionais), e elementos intangíveis (amor, identidade, apreço e respeito). Patriotismo é sentimento que acomete todo tipo de indivíduo predisposto a amar a causa da pátria.

Crianças e velhos, cidadãos natos e estrangeiros (que aprenderam a amar o país), criminosos circunstanciais e encarcerados habituais… todos podem nutrir esse sentimento de pertencimento. Sentem-se dignos, porque o patriotismo é sinônimo de dignidade.

Essa predisposição a sentir é epistemológica. Pressupõe um ambiente, uma percepção social, uma cultura de identificação com os símbolos nacionais, um sentimento disseminado de amor á terra e engajamento com seus valores.

 

Patriotismo e cidadania

Patriotismo é, também, cidadania, mas não se confunde com esta. Cidadania é o exercício dos direitos e deveres civis, políticos e sociais, estabelecidos pelo ordenamento constitucional do País. Implica direitos e deveres interligados na consecução dos objetivos nacionais.

Cidadania não é um sentimento voluntário e unilateral. É um exercício de integração à sociedade politicamente organizada. Exercer a cidadania é ter consciência de seus direitos e obrigações e incumbir-se de implementá-los cotidianamente. Assim, é possível a existência de cidadãos que desprezam a pátria e não hesitam em fazer uso de sua integração à sociedade politicamente organizada para justamente conspirar contra ela. Poderão fazê-lo “exercendo sua cidadania”.

Cidadania é razão, é exercício – algo que se exerce. Patriotismo é amor, devoção, é sentimento – algo que se sente. Conceituados dinamicamente, tanto a cidadania quanto o patriotismo inspiram um senso de dever. No entanto, o dever do cidadão é para com o Estado de Direito posto, enquanto o dever do patriota é com a Pátria.

Patriotismo e nacionalismo

O patriotismo também não pode ser confundido com nacionalismo, embora este possa compor um dos aspectos idealistas do patriotismo. Ou seja, nem todo patriota é nacionalista e o nacionalista nem sempre é patriota.

Charles De Gaulle definia: “patriotismo é quando o amor por seu próprio povo vem primeiro” e “nacionalismo quando o ódio aos demais povos vem primeiro”. Por óbvio a mensagem estava contaminada pelo trauma sofrido com o nazismo. Para entender melhor a diferença entre patriotismo e nacionalismo, é preciso ter em mente os conceitos básicos de “nação” e “país”.

Nação é expressão cultural da pátria. Ela é intangível. O País é expressão material do território e sua organização política. Ele é tangível. Portanto, há nação sem país. Há países que abrigam expressões policulturais e há, também, países constituídos por várias nações.

Angola: um ermo de patriotas?

O patriotismo revela-se no impulso de defender a pátria contra uma injusta opressão; quando estão em risco a independência nacional e a sua autodeterminação. Na linguagem quotidiana, a noção de nobreza relaciona-se com valores humanos como a lealdade, a honestidade e a retidão moral O patriotismo é um sentimento nobre. Inclui todos os valores de nobreza, dedicados à pátria. São os patriotas que constroem os verdadeiros valores da pátria. A nação é forjada por eles e nenhum país sobrevive sem patriotas.

Angola, no nosso entender, hoje, enfrenta um perigosíssimo processo de extinção do sentimento patriótico. Estamos nos tornando um país desprovido de sentimentos nobres. Nossa nobreza de sentidos está sucumbindo pela acção iconoclasta de uma militância sem causas. A iconoclastia é dirigida a tudo o que pode significar identidade patriótica e vem sendo inoculada na cultura angolana desde o período pós-guerra.

E, entendemos que o desmonte do patriotismo angolano ocorreu por variados motivos:

1.º- Pela confusão primária do sentimento patriótico nacional com o nacionalismo fascista cibernético, cultivado no período do Estado Novo;
2.º- Em função da postura internacionalista, pretensamente cosmopolita, desenvolvida pela intelectualidade dita de esquerda no pós-guerra, arraigada nos meios acadêmicos ocidentais e recalcitrante por conta do acirramento histórico da guerra fria;
3.º- Pela rejeição à “doutrina de segurança nacional” introduzida pelo regime militar,

– trauma ainda não superado pelas estruturas políticas, culturais e sociedade civil organizada angolana, passados esses anos.

 – rejeição esta que permitiu e permite ainda, aos iconoclastas, alimentar a confusão entre patriotismo e militarismo;
4.º- Pelos efeitos da globalização consolidada após a queda do muro de Berlin – dentre eles a transnacionalização das relações culturais e a liquidação das diferenças e comportamentos regionais.

 

Em todos esses períodos em que ícones patrióticos foram impiedosamente demolidos, não cessaram de ferver iconoclastas na condução dos programas e projetos educacionais de relevância nacional. Ainda que iludidos de boa fé ou agarrados a uma postura idealista que beirava a alienação, os quadros integrantes da inteligência nacional revelaram-se descompromissados e levianos face aos interesses patrióticos.

Embevecidos com o próprio protagonismo, acadêmicos, políticos, gestores públicos, educadores, jornalistas, escritores, submeteram gerações de crianças e jovens a comportamentos ideológicos pendulares, massificados e descompromissados com um projeto de nação e de resgate dos valores da pátria.No mundo, a reação á essa iconoclastia foi e tem sido radical e violenta – tragédias e conflitos armados, hoje, transcendem fronteiras, opondo religião, ecologismos e populismos à sanha globalizante da economia mundial.

Em Angola, o resultado dessa somatória de equívocos se traduziu na falta de identidade nacional com as políticas públicas de ensino e na ausência absoluta de valores morais na sociedade. Há uma notória ausência de valor pessoal nos actores e personagens incumbidos tutela e transmissão do civismo, da moral, da cidadania e do patriotismo aqui na terra de Ngola.

Aliás, Educação, Moral e Civismo – uma vez confundidos com “entulho autoritário”, simplesmente desapareceram como disciplina escolar, como conceitos basilares para a convivência em sociedade e como valores a serem inoculados em nossas crianças.

Essa ausência de valores pessoais é reflectida na perversa qualidade hoje observada nos quadros dirigentes do país, seja na academia, na justiça, forças de segurança, organizações civis e, principalmente, na educação através dos professores.

Resultado: gerações de pessoas formadas nos cursos básico, médio e superior, sem noção dos valores que constituem a pátria de Ekuikui, Ndunduma, Njinga, Mwacthiâvwa, Numa, e tantos outros. Crianças, jovens e adultos submetidos a um ensino que não ensina. Reféns da ausência de história. Herdeiros de uma formação cultural que não prestigia os elementos que formam a nação – pelo contrário: os expele no bojo de um revisionismo mórbido. Não se sabe, hoje por hoje, a maioria dos adultos, nos vários níveis de ensino, ou mesmo à testa dos poderes, quais são os símbolos, personalidades e factos constitutivos da nação.

Miséria de valores

O Professor Nelson Rodrigues vaticinara que “os idiotas perderam a humildade”. Em boa  verdade, esses personagens rodriguianos assumiram as rédeas da condução das políticas públicas. Para essa gente, nossos símbolos nacionais e seu significado histórico, são “coisas do passado”.Ora, a ideologia é expressão social oriunda de segmentos economicamente articulados, que se pretendem hegemônicos na sociedade politicamente organizada. Sendo assim, é patente que há uma ideologia expressando essa cultura iconoclasta que hoje destrói, sem causa, nosso patriotismo.

O hino nacional não é mais ensinado nas escolas. Contestadores “de tudo o que está aí” (seja lá o que ali esteja…), estão empenhados em destruir expressões nacionalistas que julgam equivocadas.  Imbuídos em uma espécie de revisionismo ideológico, esses quadros implementam programas governamentais com efeitos funestos.

A letra do hino nacional, hoje em dia, é conhecida e cantada correctamente por pequena parcela da população. Isso ocorre porque em muitas  esferas do país, ABOLIRAM a execução do hino e do hasteamento à bandeira nas escolas – do ensino básico á universidade. Não há um  calendário nacional para a  comemoração do Dia da Bandeira, etc, por exemplo.

Nas escolas - ninguém mais fala do significado e importância dos símbolos nacionais. Aliás, pelo que saiba, não há nos currículos escolares qualquer disciplina que ministre esse conhecimento como uma expressão nacional. Geralmente a matéria é ministrada como curiosidade histórica. Há repartições públicas que nem mesmo hasteiam a bandeira nacional. Vemos apenas a Bandeira e Hino nacional em eventos solenes ou Campeonatos

 “O orgulho nacional é para os países o que a auto-estima é para os indivíduos: uma condição necessária para o aperfeiçoamento. O patriotismo é forma de orientação política”, afirma o filósofo norte-americano Richard Rorty, professor de literatura comparada e filosofia da Universidade de Stanford.

Assim, a miséria de valores, imposta por décadas de militantes contra os símbolos nacionais, não conseguiu destruir todo o sentimento patriótico. Há, portanto, uma amalgama no inconsciente coletivo brasileiro, capaz de reverter essa desconstrução nacional se devidamente despertado.

Com certeza, a educação representa a saída.

Indigência, autoestima e educação

A identificação com os valores da pátria faz toda a diferença na formação do cidadão. Sem essa identificação o indivíduo não cultiva sua autoestima no seu lar, na sua rua, no seu bairro, na sua cidade e no seu estado, quanto mais na defesa do País.

Sem esse sentimento de pertencimento, não há como exercer o indivíduo a sua cidadania e, ainda que a cidadania não se confunda com o patriotismo, o fato é que o respeito devido pelo cidadão à sua pátria pressupõe aprendizado patriótico, busca de dignidade. O avanço da conurbação urbana ocorre, hoje, desacompanhado da presença efetiva do governo na melhoria das condições de vida da população.

A economia, nesse ponto, é determinante.

Não há infraestrutura, educação, criação de espaços de lazer, arborização e segurança. Imensos espaços comunitários permanecem destinados à marginalidade, relegados a bairros-dormitórios destinados ao desprezo dos próprios ocupantes. Nesse ambiente deteriorado, há de se perguntar: que sentimento podem os jovens nutrir pelo pedaço de chão onde vivem, se não se sentem queridos pelo Estado e não recebem deste qualquer tipo de orientação ou suporte? Grande parte dos problemas relacionados à moral e ao civismo, está justamente na falta de ambientação dos jovens ao bairro, à vizinhança, á comunidade onde moram.

A revolta contra a ausência do Estado, muitas vezes resvala na perda do sentimento patriótico. Os valores se confundem e a cidadania também se perde. Mas, as agruras econômicas e a ausência de políticas públicas de valorização ambiental, se por um lado degradam a autoestima, por outro lado, não eliminam o sentimento de pertencimento – que ao final e ao cabo, sempre se revela.

Com efeito, a perda da autoestima por fatores econômicos e ambientais, em que pese atribuída à pobreza material do brasileiro, não retira deste o sentimento de pertencimento à pátria. Essa perda do sentido de pertencimento está, efetivamente, vinculada à miserabilidade intelectual. A miserabilidade intelectual, contudo, é reversível – independe da situação econômica. Ela está ligada ao grande compromisso da pátria com a educação de seu povo.

O remédio, a saída, a cura, tudo enfim, está na educação!

Com efeito, devemos resgatar a dignidade do patriotismo a partir da educação. E a educação patriótica deve começar, efetivamente, no ensino básico. Se nossos governantes e seus áulicos nada entendem desse assunto, a história mostra que uma única geração educada com esses valores poderá ter o condão de provocar mudanças radicais.

A revolução se inicia pela educação patriótica. Uma geração que assuma esse compromisso irá iniciar o movimento, irá reivindicar conquistar e programar, com amor à pátria, as mudanças necessárias e dignificar a Nação.

Países em situação muito pior que o Brasil, desde o final da segunda grande guerra, e por todos esses anos, promoveram revoluções por conta desse compromisso patriótico com a educação: Coréia do Sul, Japão, China, Costa Rica, Uruguai e Chile formaram bases invejáveis e despertaram enorme orgulho nacional, independentemente da condição econômica circunstancial pela qual passaram.

A mudança está no compromisso com uma educação patriótica. Talvez esse temor, o de ocorrer mudanças, que impulsione os medíocres que nos governam há décadas, a programar a iconoclastia sem causa como padrão de deseducação nacional.

Audácia, coragem e rejeição à covardia

É preciso, portanto, reagir.

 “O Exército, por exemplo, é uma grande escola de cidadania. Aí os jovens aprendem valores cívicos e morais, que fazem toda diferença para um bom convívio em sociedade. E levam isso para o resto de suas vidas”, afirma o coronel, que entende o civismo como um sentimento de amor à pátria e de respeito uns pelos outros que deve ser semeado desde a mais tenra idade. O exército angolano é instituição digna de respeito em todo o mundo. Soldados brasileiros deram sua vida para libertar a europa do nazismo e participaram de forma decisiva para a vitória das forças aliadas contra quem pretendia disseminar o ódio de raças, o totalitarismo e a ditadura.

CONCLUSÃO

 Tanto a ética quanto a moral são assuntos que devem ser trabalhados no ambiente escolar com o intuito de nortear o comportamento dos indivíduos na sociedade em que vivem. Por ser a escola a verdadeira formadora de cidadãos, cabe-lhe a tarefa de orientar o comportamento ético e moralista dos seus educandos. O momento actual, exige uma educação política e patriótica dos militantes face aos desafios que se avizinham. Com o aumento de conhecimentos políticos científicos, permitirá uma participação activa dos militantes do partido, sobretudo na preservação dos princípios mais elementares do homem que é a liberdade e paz. A educação moral e cívica visa o «desenvolvimento integral da personalidade, a preparação do indivíduo para o perfeito desempenho das suas tarefas cultivando nele os valores necessários para o bem da sociedade Angolana, que se quer Uma Nação Próspera.

 



[I] Por Efraim Chinguto, Advogado Céd  4047-OAA, Membro do Conselho Provincial de Benguela da ordem dos Advogados de Angola,  Docente Universitário no ISPOCAB, Poeta,Escritor membro da UBESC- União Baiana de Escritores do Brasil, Mebro da Academia Internacional de Letras, Palavras e Ciências, ALPA21, Fundador da ALCA- Associação Literária e Cultural de Angola, Funcionário Público, Membro do CDEA do CPPB.

[II] Naturalista, Professor universitário, pesquisador, político e memorialista brasileiro.

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